@rropa
Na cidade de Valência, Espanha,
um grupo de mulheres sentiu-se inspirado pelo Espírito Santo. O Espírito
Santo
juntou-as, amassou-lhes os sonhos, levedou-lhes a imaginação, abriu-lhes uma
janela de vida, e, junto
às torres de Serranos, num espaço de setenta metros
quadrados nasceu a loja @rropa. São vinte e cinco mulheres, uma
espanholas outras não. Umas vêm da toxicodependência, outras estão contaminadas
pela SIDA, muitas vieram da imigração magrebina. As idades vão dos vinte e
cinco aos quarenta. Que fazem estas mulheres? De coisas mais ou menos velhas
fazem coisas novas. Em poucos dias receberam, seleccionaram, escolheram,
trataram, cuidaram, prepararam quinhentas toneladas de roupa. Sim, quinhentas
toneladas! A que de nada servia queimaram. A que estavam em condições
preparam-na para revenda. Antes receberam formação equivalente ao 12º ano numa
Escola de Adultos e apoios como cidadãos de pleno direito, agora são
funcionárias da @rropa que pertence à Cáritas Diocesana de Valência.
Se fôr a Valência procure a
loja @rropa. Vá pela curiosidade ou pelo que quiser. Se entrar verá à venda
roupa em segunda mão como se fosse nova. Encontrará sapatilhas de lona,
babetes, camisas, tailleurs, roupa da Primeira Comunhão, calças, saias... e
muito mais. Os preços são módicos, entre mil e mil e quinhentos escudos! Quem
está noiva e não tem posses pode passar por lá, também há vestidos! Lindíssimos
vestidos de noiva a vinte e cinco mil escudos! Estas coisas dão que pensar, e
nem admira. Afinal, quando o Espírito Santo se derrama sobre o barro inerte faz
coisas lindas!
Pequeno Desejo
Todos cumprimos algumas vez um
desejo. Que felicidade! E, creio, todos tivemos já oportunidade de vermos
alguém feliz porque lhe concretizamos ou possibilitamos a realização dum
desejo! Não há felicidade igual...
Em Espanha (mais uma vez!...)
acaba de nascer uma coisa interessante. Há um ano e a partir duma ideia dum
executivo duma produtora internacional de programas infantis e juvenis de
televisão nasceu a Fundação Pequeno Desejo! Tem um modesto objectivo:
esforçar-se todos os dias por concretizar as ilusões de crianças enfermas
terminais ou crónicas. Pode ser apenas um simples festa de anos, ou uma visita
ao zoológico, ou conhecer um futebolista. Podem ser coisas muito simples, que
não livram nem da dor nem da doença, mas aqueles meninos são um poucochinho
mais felizes, mais meninos. A Fundação está bem assessorada e estruturada,
esconde a burocracia porque deseja apenas um mundo mais humano semeando
sorrisos onde só há dor e desalento.
E fazem coisas bonitas: João,
cinco anos, quis ser bombeiro por um dia e foi!; Lourdes, 15 anos, quis
conhecer Chayanne, o seu cantor preferido, e conheceu!; Marina, 9 anos, queria
ir à Disneylandia e foi. É cega mas lembra-se bem da Minnie e do Micky!; Laura
quis ter uma festa de anos com os amigos do hospital e do colégio e teve!
São pequenos desejos,
concretizados com carinho, discrição, eficácia e delicadeza. São pequenos
sonhos que por vezes mudam vidas como só as consegue mudar a força do Espírito
de Deus. O Espírito Santo actua mesmo! Em Portugal, se a Fundação Pequeno
Desejo surgir, eu proponho para patrono da fundação o Pedro Mantorras, porque é
menino e porque a forma como partilhou a alegria com o Tiago foi algo único,
lindo!
Herói
Um Air bus 310 A pesa 138 600 quilos. E voa. Não sei como,
mas voa. Desloca-se a Mach 0,8. Não sei o que é, mas quer dizer a velocidade a
que o bicho voa. Com os tanques cheios pode voar oito mil quilómetros. Uma
pequena maravilha da técnica e da inteligência ao serviço do homem.
No dia 24 de Agosto, sexta-feira, um homem aguentou o
bicho no ar durante 18 minutos e 60 quilómetros, depois aterrou a 500
quilómetros à hora no aeroporto das Lajes, na Ilha Terceira! Não havia
combustível, não havia motores. Desde que em pleno oceano Atlântico o piloto
recebeu a notícia até que aterrou passaram 81 minutos, quase um jogo de
futebol. E o bicho planou no ar, simplesmente! Lá dentro iam 293 pessoas, e o
piloto era uma delas, claro! Cá em baixo, como lá em cima, eram 6:43 horas, e a
localidade da Praia da Vitória dormia e nem cheirou o perigo, nem estremeceu
com o pressentimento.
Quando o Air bus A 310 aterrou consumara-se uma façanha
sem par na história da aviação. Em Portugal, onde se registara o feito quase
ninguém ouviu falar do assunto! Lá fora, os jornais e telejornais deram honras
de primeira página ao herói que não queria sê-lo. Nesses dias só conhecíamos um
nome: Melitão; e esquecemos o herói da aterragem milagrosa: Robert Piché, que
disse ter feito apenas o que aprendeu a fazer. E também disse que «ao leme do
avião sou mais que eu». Nem podia ser o contrário. Aliás os passageiros admiram
a coragem do homem e afirmam que ali esteve a mão de Deus. Dizem que ao menino
e ao borracho põe-lhe Deus a mão por baxo. E deve ser verdade.
Sabe a que se parece uma ilha a 60 quilómetros de
distância? Não se parece a nada porque não existe. Mas a fé de Robert Piché
afirma que existe, e quem somos nós para o negar? E porque haveria de haver
sempre um Melitão a enegrecer o céu e a presença de Deus quando Ele anda tão
perto de nós!
Presságios
As primeiras eleições livres em Timor já foram. Decorreram
sem incidentes de maior. Se pecadilhos existiram foram fruto do acne duma
democracia incipiente.
Não acompanhei muito o assunto. Reservo para o meu baú uma
fotografia de primeira página do Público. Vê-se uma criança de chapéu e 14
sombras. Parece que são sombras da fila que vai a votos. Mas quem me garante
que as sombras vão a votos? Quem me sossega e me diz que as sombras não se
preparam para cercar e devorar a criança-Timor? Em quem devo confiar, na
fragilidade da criança ou no negrume das sombras? Quero crer que a criança
significa esperança, futuro, alegria, coisas novas. Mas o fotógrafo tinha mesmo
de a emparedar contra um muro de sombras? Claro que outro tanto da fotografia é
luz, mas se lermos a foto as nesgas de
luz que se abrem ao futuro são bem raras e bem estreitas. Nada garante nada,
são apenas presságios.
1’ de sabedoria
Dois homens, ambos gravemente doentes, estavam no mesmo
quarto de hospital. Um deles, podia apenas sentar-se na sua cama durante uma
hora, todas as tardes. A sua cama estava junto da única janela do quarto. O
outro homem tinha de ficar sempre deitado de costas. Os homens conversavam
horas a fio. Falavam das suas mulheres e famílias, das suas casas, dos seus
empregos, onde tinham passado as férias... E todas as tardes, quando o homem da
cama perto da janela se sentava, ele passava o tempo a descrever ao seu
companheiro de quarto, todas as coisas que ele conseguia ver do lado de fora
da janela. O homem da cama do lado começou a viver à espera desses
períodos de uma hora, em que o seu mundo era alargado e animado por toda a
actividade e cor do mundo do lado de fora da janela. A janela dava para um
parque com um lindo lago. Patos e cisnes chapinhavam na água enquanto as
crianças brincavam com os seus barquinhos. Jovens namorados caminhavam de
braços dados por entre as flores de todas as cores do arco-íris. Árvores velhas
e enormes acariciavam a paisagem, e uma ténue vista da silhueta da cidade podia
ser vista no horizonte. Enquanto o homem da cama perto da janela
descrevia isto tudo com extraordinário pormenor, o homem no outro lado do
quarto fechava os seus olhos e imaginava a pitoresca cena. Um dia, o homem
perto da janela descreveu um desfile que ia a passar. Embora o outro homem não
conseguisse ouvir a banda, ele conseguia vê-la e ouvi-la na sua mente,
enquanto o outro senhor a retractava através de palavras bastante descritivas.
Dias e semanas passaram.
Uma manhã, a enfermeira chegou ao quarto trazendo água
para os seus banhos, e encontrou o corpo sem vida do homem perto da janela, que
tinha falecido calmamente enquanto dormia. Ela ficou muito triste e chamou os
funcionários do hospital para que levassem o corpo. Logo que lhe pareceu
apropriado, o outro homem perguntou se podia ser colocado na cama perto da
janela. A enfermeira disse logo que sim e fez a troca. Depois de se certificar
de que o homem estava bem instalado, a enfermeira deixou o quarto.
Lentamente, e cheio de dores, o homem ergueu-se, apoiado
no cotovelo, para contemplar o mundo lá fora. Fez um grande esforço e
lentamente olhou para o lado de fora da janela... que dava, afinal, para uma
parede de tijolo! O homem perguntou à enfermeira o que teria feito com que
o seu falecido companheiro de quarto, lhe tivesse descrito coisas tão
maravilhosas do lado de fora da janela. A enfermeira respondeu que o homem era
cego e nem sequer conseguia ver a parede. "Talvez ele quisesse apenas
dar-lhe coragem...".
[23 de Setembro de 2001]
[23 de Setembro de 2001]
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