Irredutíveis
Na terça-feira, 1 de Maio, subi a
Penhalonga para presidir a uma eucaristia de acção de graças. Coisa natural...
O que já não vai sendo muito natural é que isso se faça porque nasce um rancho
folclórico! Claro que sabia ao que ia, e rejubilei ainda mais ao ver que o
rancho era afinal infantil e estava apadrinhado e bem pelo rancho da Maia e o
de S. Sebastião de Resende. Parabéns. Saí de lá com as mãos cheias de amigos e
o coração em festa. De tarde não pude ir ao bailarico e fiquei com pena, mas
dei graças ao Deus da alegria pela primavera que vai despontando. Aquelas
crianças levam-me a confiar que alguns pedacinhos da nossa história e da nossa
cultura tardarão muito a desaparecer. Já pode vir o inverno, e sermos invadidos
pelo exército da música anglo-saxónica, porque os nossos defensores já estão
ali naquele pequenino reduto de irredutíveis penhalonguenses. E confio que não
sejam os únicos.
Agora só fico à espera que gravem
um CD!
Sinal +
No fim de semana 5-6 de Maio realizou-se o Fátima Jovem
sob o lema «Vem e segue-Me». Éramos não sei quantos milhares de jovens sob o
signo da cruz e do seguimento, do encontro e do plus da alegria mais. Apesar de reduzido no programa foram muitas
as actividades. Centro-me nas palavras de D. Serafim, bispo de Leiria-Fátima
que presidiu à eucaristia de encerramento: «A cruz presidiu ao vosso encontro
como um sinal. A cruz é um sinal e um desafio. Não deixeis de seguir o sinal
mais da cruz e de ouvir a palavra do Mestre que te diz ‘Vem e segue-me’!».
Era o Domingo do Bom Pastor e da oração pelas vocações
consagradas. E o Fátima Jovem foi todo ele marcado pelo sinal + da
vocação! Seria bom que o sinal + se multiplicasse em muitos corações e
produzisse frutos ainda + saborosos, adesões + coerentes,
seguimento + consequente, vida + santa, comunidades +
vivas, testemunhos + credíveis, grupos + arrojados e +
comprometidos.
Sinceramente, eu aposto por um século de sinal +!
Terceira idade
Ao passar os olhos por uma revista leio o texto de um
velho. Vou resumi-lo: tenho 82 anos, sou velho, doente cheio de achaques e
débil. Quando era novo, era forte, robusto, desportista e cheio de saúde. O
único desporto que como velho estou capaz de praticar é o humor! Os jovens
querem os velhos como testemunhas do passado e inspiradores do futuro. É este o
nosso tesouro. Continua o velho: Antigamente coleccionei anedotas, mas perdi o
caderno; agora colecciono máximas de sábios. Vivo mais livre que quando era
novo, e pelo menos três horas do meu dia dedico-as ao estudo. E conclui: tenho
algumas preocupações que procuro nunca esquecer. Resumem-se assim nunca perder
a confiança nos meus esforços nem nas minhas possibilidades; não procurar que
os outros tenham de sofrer também pelos meus males e que sejam obrigados a ter
pena da minha solidão; aceitar sempre de bom humor a ajuda dos outros; fazer
sempre qualquer coisa de útil para os outros, ainda que seja só um sorriso ou
um olhar.
Em conclusão: ainda que o peso da
vida pese demasiado nunca é chegada a idade da reforma!
Arte
Chama-se Fernando Lanhas, tem 78
anos e é do Porto. Foi o introdutor do Abstracionismo geométrico em Porugal.
Até 7 de Julho estará em exposição no Museu de Arte Contemporânea, em
Serralves. No correr da notícia que surfava nas ondas da rádio foi só o que
apanhei. Deve valer a pena, porque um Presidente da República também deve
inaugurar exposições, mas não qualquer uma.
Pessoalmente tenho um eterno
conflito com a arte moderna. Desde que me obrigue a interpretar cavalos a trote
onde quem está a meu lado afirma a pés juntos ver
estrelas-do-mar-numa-manhã-triste-de-Outono abriu-se o conflito. Por isso, da
primeira vez, quando ouvi que era sobre arte
contemporânea nem liguei. Mas como no mesmo dia ouvi quinze vezes a mesma
notícia até a cansada voz do homem se me gravou no fundo da alma. E o que ele
dizia. E dizia mais ou menos que esta exposição é um repositório de muitos
percursos em retrospectiva. E até é criticável, porque não soube fazer melhor!
Confesso a minha ignorância: não conheço Fernando Lanhas.
Mas um homem que tem a humildade de dizer que não conseguiu fazer melhor merece
o meu respeito. Quem diz que amanhã se sentará sobre o saber acumulado até hoje
para inventar um novo percurso merece o meu reconhecimento. Quem no meio de uma
exposição-repositório chama esboço à longa retrospectiva que apresenta ao
público merece que eu a vá ver e aprender com ele|com ela alguma coisa. É o que
procurarei fazer, mesmo sabendo que quando lá for o homem que encontrar
(encontrar-se com a obra de alguém é encontrá-lo a ele também, ou não?) já
andará por outros caminhos, trotando outros esboços, de pincel em riste,
desafiando moinhos de vento e pintando nas velas as delicadas estrelas do mar.
Vaso novo
Hokusi foi um dos mais famosos artistas japoneses do
século XVIII. A ele se deve um belíssimo jarrão onde pintou uma magnífica
panorâmica da Fuji-Yama, a montanha sagrada. Mais tarde, ainda em vida do
pintor, alguém deixou cair o jarrão e este partiu-se. Todos lamentaram a perda
de tão preciosa peça de arte. Chamaram o artista. Este simplesmente pegou nos
fragmentos e com muita paciência foi
reconstituindo a obra. Porém, desejou recordar o acontecimento que havia
quebrado a história daquele belo jarrão e assinalou todas as juntas com um
delicado fio de ouro. Em consequência o jarrão tornou-se mais bonito do que era
antes!
Não há ressurreição sem morte. Páscoa feliz.
[7 de Maio de 2001]
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