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sexta-feira, 10 de maio de 2013

Notas de Roda-pé



Elo
Foi Ele que propôs a Aliança. É Ele que sustenta a Aliança. É Ele quem renova a Aliança. É Ele quem restaura a Aliança. Ele é o elo mais forte. Ele é concerteza o elo mais forte, mas necessita de nós... O elo mais forte não derrota ninguém, espera por nós, necessita de nós, joga connosco. O elo mais forte precisa do elo mais fraco. Não joga ao «bota fora». Fora ou dentro joga sempre o jogo da vida connosco. Vida em aliança. Ele é o elo mais forte, mas não fica mais fraco se lhe ganharmos o jogo. Aliás, o elo mais forte joga para perder. E ganha se ganharmos. E nós ganhamos se Ele perder. Foi Ele quem o disse. Na cruz Ele perdeu para ganhar e ganhou-nos de vez, mesmo que antes tenhamos perdido ao romper a aliança. O elo mais forte ganhou perdendo, e na sua derrota ganhamos nós, o elo mais fraco.
Ó feliz culpa!

Oxalá
Alguém chamou «mística do oxalá» àquela tendência demasiadamente humana de frequentemente enchermos a boca e o coração com adiamentos: «Oxalá eu fosse rico!»; «Oxalá a minha mulher tivesse carácter»; «Oxalá a saúde dos meus filhos fosse melhor»; Oxalá o meu patrão fosse honesto»; «Oxalá o meu sócio fosse pontual»; «Oxalá eu tivesse mais tempo»; «Rezarei quando tiver mais tempo, oxalá..»; «Quando me reformar começo a ler a Bíblia».
Pois sim, na era da vertigem vivemos para o «oxalá» quando se esperaria a capacidade de viver para o «hoje», o «já». Lamentamos, arrastamo-nos.
A vertigem é provavelmente virtual, muito pouco real. Ou talvez nos tenhamos convertido em virtuais e já não nos lembremos que nada é para amanhã. É hoje, aqui e agora, nas circunstâncias concretas da vida que o encontro se dá. Sim, o encontro. Com que volúpia vivemos o adiamento do encontro! Julgamos necessário criar condições ideais de aconchego, e ele dá-se na valeta dos caminhos. Julgamos necessário convocar toda a imprensa, e ele dá-se no anonimato. Julgamos necessário esperar pelo descanso merecido, e ele acontece quando as mãos estão atadas às redes (e também no fim de uma campanha fracassada...). Julgamos necessário cursar todos os conceitos, e ele dá-se no pré-conceito! Julgamos, estruturamos, adiamos. E afinal é onde me encontro, e como me encontro, que Deus se quer encontrar comigo.

Bíblia
Ana Maria Alves nasceu no dia 4 de Julho de 1902, em Pico de Regalados, Vila Verde. Nasceu na Casa onde mora. Tem cinco filhos, dezasseis netos e vinte e nove bisnetos. Não fora a descendência e a rotina da sua vida pouco teria mudado: trabalho e fé em Deus.
Agora tem mais tempo, e já que o tem emprega-o no que sempre gostou: ler! Acabou de ler as memórias da Irmã Lúcia (sem recurso a lentes!) e não passa dia que não leia a Bíblia! Custa-lhe, isso sim, ler letra miudinha como a das Cartas de S. Paulo, mas não lhe custa nada ler o Evangelho de S. Marcos.
Não creio que exista receita para a longevidade. Mas viver cem anos empapado em Palavra de Deus deve ser caso raro. Ao nível da fé costumamos chamar pão à Palavra. Não me admiraria que tal ementa favorecesse o optimismo e o gosto de viver de Dª Ana Maria Alves. Quanto caberia aprender dela!

Todo
Há homens que nos marcam. Às vezes nem sabemos por quê. Mas o certo é que nos marcam. O dr. Raimundo C. Meireles marcou-me. Não sei porquê mas marcou-me. Penso que foi a sua simplicidade e o facto de ser velho e lúcido. Após 42 anos de trabalho académico jubilou-se em 1999; brevemente celebrará o seu jubileu sacerdotal.
Recentemente um jornal entrevistou-o e perguntou-lhe que diria às gerações mais novas que as iluminasse na complexidade da vida actual. A resposta não podia ser mais inesperadamente iluminadora: «contradigo-te para que possuas a totalidade» (S. Agostinho! Nem mais. O todo não a parte é o que nos sacia. Não apenas o acelarador mas também o travão. Não apenas a tradição mas também o progresso. Não apenas a inovação mas também a conservação. Não apenas a velocidade mas também a contemplação. Oferecer a outra parte a quem só se abre à contrária. Oferecer a totalidade a quem se confina a uma fracção. Ó que programa mais exigente! Mais exigente para o mestre que para o discípulo. Não basta contradizer, é necessário oferecer a parte em falta oferecendo a visão global que promove o progresso de que necessitamos.

Filhos
Li uma notícia curiosa num daqueles rodapés que os telejornais inventaram como se fossem talhos a debitar os produtos à disposição do cliente. O recurso é curioso, passa informação menor sem implicações de maior. Num destes dias li que o governo passara a promover o aumento do número de filhos por casal. Não garanto que o texto fosse este, mas a mensagem era. Fiquei perplexo e duvidoso, mas a mensagem passou de novo. Não havia dúvida. Não garanto a fundamentação que possa ter, não li nem ouvi mais nada sobre o assunto.
Como não vão longe os tempos em que o ideal era ter um ou dois filhos! Só um ou dois! Quem não se lembra do esforço que se fez em promover o aumento da qualidade de vida e educação dos filhos (e para tal se propunha a diminuição dos mesmos...)? Então, como é? Já é necessário inverter o discurso? Bastará apenas apostar num filho? Porquê agora a necessidade de aumentar a natalidade? Porque é que em tão pouco tempo variam tanto as opiniões e a legislação e em assuntos tão importantes?
Mais uma vez o discurso da Igreja Católica se vê confirmado. O que antes era contestado e ridicularizado por arcaico («não havia televisão», lembram-se?) agora é actual e imperioso. Não se sugere, apoia-se. Não se aconselha-se, sustenta-se com subsídios. Em poucos dias mais um discurso nosso sai reconhecido..., embora apenas numa nota de rodapé!


1’ de sabedoria
Estavam todos os discípulos seriamente envolvidos numa discussão a respeito da dor e do sofrimento humano.
Segundo uns, a causa da dor é o egoísmo; segundo outros é a ilusão; outros ainda afirmavam que se devia à incapacidade de distinguir o real do irreal. Por fim consultaram o Mestre, que disse:
-- Todo o sofrimento que existe vem da incapacidade que as pessoas têm de ficar paradas e a sós consigo mesmas.

 [16 de Julho de 2002]

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