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sexta-feira, 26 de julho de 2013

Notas de Roda-pé


Morcegos
Há uma piada passada entre dois sacerdotes, com o seguinte diálogo:
— Tenho na minha igreja uns morcegos, e não sei que lhes fazer...
— Fazer o quê?, diz o segundo.
— Não sei. Até a Equipa de Pastoral e a Fabriqueira fizeram de tudo.
— De tudo o quê?, insistia o segundo.
— Já tentámos de tudo para os espantar da igreja.
O outro rindo às gargalhadas, responde-lhe:
— Ó pá, é muito fácil. Dá-lhes o Crisma que tu vais ver!

Jovens
Não sei se a piada se percebe de imediato, mas ela fala simplesmente da ausência dos jovens na Igreja. Já passou à história aquele momento da Igreja em que todo o nascido nela entrava pela do Baptismo e por ela saía no dia do funeral. Já não é assim. Nem todos entram na Igreja, e dos que entram a maioria abandona-a na adolescência. Por aqui vão ficando até ao Crisma. Depois vão-se, desaparecem, esfumam-se. Parece que sentem alergia, e depois do Crisma...
Eu sei que a maioria ainda se diz Católico. E são-no, mas à sua maneira. Pessoalmente não vivo sossegado só porque cá fiquei, nem por verificar que o índice de Católicos é bastante alto. Não vivo sossegado, mas inquieto. Inquietam-me muito as muitas ovelhas vagueando por aí sem pastor, à mercê de lobos e de mercenários.
Voltemos aos jovens. As Jornadas Mundiais da Juventude são um ledo engano. Mas não são de desprezar. O que ali se vê não corresponde à vida das comunidades locais. Eu que participei em três sei o que são. São uma festa que eu vivi, quase delirante, enquanto jovem seminarista. São uma festa que eu vivi, cuidadoso e cauteloso, no início do meu sacerdócio. Mas quer-me parecer, que nem no antes nem no depois têm implicações imediatas. Pelo menos ao nível comunitário, porque tal vivência tem muito de pessoal e íntimo e isso não é tão fácil de medir.
Eis um grave problema pastoral. Os jovens fogem da Igreja para as celebrações do futebol e dos concertos, dos ralis e das discotecas. É ali que os perdemos. E quando, cansados, dali regressam, porque alguns sempre regressam, o trabalho de formação — pelo menos esse — está muito atrasado. (Sempre quero aqui contar que este ano só porque o Paris-Dakar foi anulado, eu tinha mais jovens na missa desse dia: os que em Lisboa iriam assistir à partida da prova quedaram-se por cá!)

Jesus jovem
Devo confessar a verdade: O que eu venho aqui falar com os leitores do Mensageiro é sobre Jesus. Jesus jovem. Onde pára o Jesus jovem? Porque não se vê? Este ver a que me refiro é o ver celebrativo (mais que o histórico). Quero eu dizer que a celebração litúrgica ajuda a enquadrar e formar a memória do discípulo que é cada um de nós. E o certo é que os jovens Católicos não vêem o jovem Jesus! Nem nas celebrações nem na história.
Ninguém vive sem modelos e sem mestres. (Agora também Lhe chamam Guru e Coach!) E como é bom, por exemplo, podermos celebrar o baptismo de alguém recordando o de Jesus, aquele momento inesquecível em que, saindo das águas do Jordão, viu o Espírito Santo e ouviu o Pai testemunhar o seu amor por Ele.
Explico-me melhor: a nossa referência maior é Jesus. Olhá-l’O e imitá-l’O é caminho seguro. Por isso a Igreja usa sabiamente a liturgia para enfocar em Jesus o nosso olhar e amor. É assim que aprendemos d’Ele, com Ele caminhamos e aprendemos a crescer.
Vamos aos factos: na Festa da Anunciação, nove meses antes do Nascimento, recordamos que Ele começou a ser humanado e que a nossa vida tem dignidade desde a sua concepção; na Festa do Natal celebramos o seu nascimento, óptima lição para os pais, familiares e amigos; na Festa da Sagrada Família é o olhar de toda a família, como família, que é convocado; na Festa do Santo Nome de Jesus (festa celebrada oito dias depois do Natal) recordamos a missão salvadora de Jesus e a verdade do nome de cada um de nós; na Festa da Epifania, somos todos, mas todos mesmo, de todas as idades, condições, religiões ou sem ela, somos todos convidados a adorar o Menino; na Festa da Apresentação a família é mais uma vez convocada, e também aqueles que desde a longa noite da história O esperam ver, como Simeão e Ana; no Baptismo, aos trinta anos, sentimo-nos convocados para como Ele assumir o papel de anunciadores da Boa Notícia.
Enfim, não há idade que não possa ir beber a Jesus. A vê-l’O humanado e aprender d’Ele, que é o Homem perfeito. Bem, há uma idade que O não vê: os jovens. Os jovens não O vêem jovem. A sua vida oculta em Nazaré deixou-nos sem relato que iluminasse a vida dos jovens. Depois que chega aos doze anos a vida de Jesus oculta-se e só volta aparecer três anos antes de morrer.
Conheço um convento que tem um Menino Jesus carpinteiro. Um jovem trabalhador. Gosto muito desse Menino Jesus. Os frades puseram-no mesmo à entrada do claustro, onde têm as suas celas. Entra-se e vê-se o jovem carpinteiro a trabalhar a madeira, com um mascoto no ar. Há ali uma mensagem: Vê-l’O dedicado a trabalhar, afadigado e comprometido com as obrigações da família e da sociedade. Jesus foi menino e jovem crente e um aprendiz, foi um mestre da Palavra e também um mestre carpinteiro a quem São José ensinou tudo o que sabia.
É disso que se trata: sabemos que o jovem Jesus foi um jovem fiel no caminho da fé, fiel no trabalho e na sociedade, mas não há um relato que no-lo diga explicitamente. O mais que sabemos, quero dizer, o mais que ouvimos, é o relato da sua peregrinação a Jerusalém, na Páscoa dos seus doze anos. Terminadas as festas os pais regressam e Ele ali fica, sentado entre os sábios a responder e a interrogar. Quando os pais O re-encontram, regressa. Regressa para continuar obediente e a crescer em estatura, sabedoria e graça. É esse o único, discreto e pouco empolgante modelo que temos para oferecer aos jovens: o modelo de adolescente obediente, dedicado, aprendiz em formação, fiel à família (e às coisas do Pai), fiel à fé judaica em que está inserido, crescendo no corpo e no espírito, em sabedoria e em graça, carinhoso para com os familiares, solícito para com o pai na sua morte, esteio para a mãe que fica viúva e certamente alegre com os companheiros, amigo das festarolas... E também preocupado com o seu futuro.
Convenhamos que não é tão pouco assim, mas o silêncio que se faz sobre a juventude de Jesus não os ajuda muito. Porém, naquela ocorrência dos doze anos e no escuro do longo silêncio da vida oculta, vemos, com um pouco de dificuldade, um belo programa de vida para os jovens, um programa que só ali se pode encontrar!

Máxima

Quem não quiser trabalhar, também não coma. (2 Tes 3:10)

Mínima


Também entre as panelas anda o Senhor. (S. Teresa de Jesus)

[21 de Janeiro de 2008]

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