Figo
Os coreanos eram nossos amigos até nos
ganharem. Simpatizavam connosco e idolatravam o Figo. Como não sabiam dizer
f-i-g-o diziam algo parecido, ou seja, o possível já que não têm o fonema
<>. Não sabiam dizer o nome do ídolo, mas gostavam do Figo à
mesma. Quando os ouvi tentar dizer o nome de Figo deu-me quase vontade de
rir. Soava estranho.
Como deve soar estranho aos ouvidos dos
coreanos o nome António! Como é que dirão António? No passado dia de S. António
dei comigo a pensar isso mesmo. Como é que ao rezarem os coreanos dizem
António? Quero dizer, como é que ao rezarem a Deus através da intercessão do
Santo português lhe vocalizam o nome? (Se é que vocalizar bem interesse para o
sucesso da prece!...)
E como soaria aos ouvidos dos coreanos o
nome dos seus santos mártires ditos por portugueses? Como diríamos a um coreano
os nomes de S. Agostinho Yi Kwang-Hon, S. Madalena Kim Obim, S. Lucia Park
Hui-sun, S. Damião Nam, ou S. Damião Nam Myong-hiog? Entender-nos-ia?
E a verdade é que ao longo do ano nós
portugueses invocamos os santos mártires coreanos e os católicos coreanos
invocam o nosso Santo. Há nisto uma comunhão e um cruzamento de fé e culturas
que em tempos só a religião possibilitou e potenciou. E está bem de ver que o
fez antes do futebol. Hoje, porém, o veículo desta comunhão cultural já não é
mais (pelo menos em grande escala) a religião. As fintas do Figo substituiram o
arrojo, audácia e valentia dos missionários. Mudaram os tempos, mudaram os
heróis. Só não mudou a necessidade que temos deles e a representatividade que
eles significam. Mesmo que não consigamos dizer bem os seus nomes.
Dúvidas
Às terças-feiras costumo ouvir o
professor Máximo Ferreira. É um astrónomo. Da última vez perguntaram-lhe em
directo como nasceu o universo. Terá sido por intervenção divina ou foi o Big
Bang (a última e mais credível explicação científica: a matéria primordial terá
explodido num enorme Big Bang que deu origem ao que conhecemos e ao muito que
desconhecemos. A explosão foi tal que o universo após milhões de milhões de
anos ainda continua em extensão, em crescimento!)? O professor Máximo Ferreira
professa a teoria do Big Bang, porque é científica. E porque não precisa nada
de Deus. Não me preocupa que Máximo Ferreira não precise de Deus. É livre de explicar
o que quiser como quiser. Aliás, apressou-se a dizer que é melhor nem nos
preocuparmos com Deus. (Eu sei que o que quer dizer é que Deus não conta nada
para explicar a origem do universo...)
Antes de continuarmos é necessário dizer
que a ciência não tem todas as certezas e tem muitas dúvidas. (E o professor
sabe-o melhor que eu.) E agora cabe perguntar: Tudo bem, professor; o mundo
começou com o Big Bang, e quem provocou o Big Bang? E porque é que a teoria
científica há-de necessariamente excluir a existência de Deus e a sua
responsabilidade (e também desejo, vontade e amor) na origem do universo
através do Big Bang? Se foi mesmo pelo Big Bang que tudo começou a começar a
quem se deve a criação das condições para tudo pudesse começar a acontecer?
O professor Máximo Ferreira vai
continuar com dúvidas.
Mortos
Na Nova Aldeia da Luz os mortos vão à
frente. Melhor, chegam à frente! A aldeia da Luz vai ser afogada pela albufeira
do Alqueva e como resultado toda a aldeia se deslocará para a Nova Luz. Depois
de tudo negociado lá chegará o dia da mudança. Inevitavelmente.
Parece que o que mais custa a mudar são
os mortos (aqueles que já não têm nem vontade nem querer...)! Ninguém gosta de
perturbar o sono dos mortos, esta é uma crença poderosa. Mas o certo é que as
negociações envolveram a mudança do cemitério pelo que também os mortos se
mudarão. E serão os primeiros a habitar a nova aldeia! Interessante: mesmo
depois de morrermos continuamos a viver e a habitar. Habitamos os sonhos e os
corações dos nossos amigos e familiares; habitamos a última herança que nos é
permitida: o cemitério. Talvez a morte não seja um fim tão fim assim!
Na Nova Luz os mortos irão à frente como
à frente da colheita vai a semente lançada à terra. Serão os mortos os
primeiros a habitá-la, serão eles quem primeiro rasgará os caminhos. Só depois
chegarão os vivos. É como se não fosse possível habitar algo que ainda o não
tivesse sido. E talvez não pudesse ser de outra maneira. Afinal de contas são
os mortos quem verdadeiramente vive. E se a morte é a porta de entrada para a
vida, então quem ainda não morreu também não vive. E como é que quem não vive
poderia ser luz e guia para quem não vive (mesmo que esteja vivo)?
Clix
A Internet é talvez o mais poderoso meio
de comunicação. É por isso mesmo um desafio, não uma ameaça. Coloca qualquer
pessoa em qualquer lugar que se encontre como companheiro de alguém no lugar
mais remoto que imaginar se possa. Claro que também liga pessoas da mesma rua,
ou vizinhos do mesmo prédio. É um meio tão interactivo e tão participativo, tão
directo e imediato que a Igreja não quer deixar de dizer sobre os telhados (na
Internet) aquilo que pensa e vive por baixo deles. Foi nesse sentido que para a
celebração do dia mundial das Comunicações Sociais o Papa desafiou os cristãos
a estar criativamente presentes na Internet para que ali manifestem os seus
pontos de vista, assumam as suas responsabilidades e realizem a obra da Igreja.
A Rede é uma porta para a evangelização!
O maior fórum para a proclamação do Evangelho! E o Papa sabe disso.
Para celebrar esse dia as paróquias de
Travassô e Pessegueiro do Vouga (Diocese de Aveiro) celebraram missas pela Net!
A novidade chamou a atenção e surpreendeu alguns desatentos. Apenas os
desatentos.
Dias depois dois jovens casaram-se. Ele
era de Vizela, ela da região de Aveiro (mais uma vez!). Conheceram-se pela Net.
Namoraram-se ali. Decidiram casar. No dia do casamento eram noivos tão felizes
como os noivos normais (não me admiraria que num futuro próximo os normais
fossem os que se conhecessem na Rede!). E o portal Clix esteve presente na
celebração do casamento, afinal de contas apadrinhara o namoro! Ainda que
involuntariamente.
Ora aí está. Não há espaço que escape ao
âmbito de acção da Igreja. Porque haveria a Net de ficar de fora? Que ali nasça
amor sincero, que ali os jovens possam começar a construir a sua casa sobre a
rocha é uma grande e feliz esperança!. É verdade que talvez seja um minúsculo
caso e nada representativo. É possível. Talvez seja semente rara, perdida e
calcada pelos caminhos da Rede. Talvez. Mas é desejável e necessário que também
ali se possam construir histórias de amor com futuro, com frutos.
1’ de sabedoria
Todo o mundo
ficou admirado quando ouviram o mestre dizer a seguinte metáfora que é tão
moderna como actual: «A vida é como um automóvel».
Todos
aguardaram em silêncio esperando uma explicação.
-- Sim, disse
por fim o mestre. Sim, um automóvel pode ser usado para levar-nos longe e a
grandes alturas.
Novo
silêncio...
-- Mas há
pessoas que preferem atirar-se para a frente dele deixando-o passar por cima
delas. E depois dizem (e há quem diga com elas...) que a culpa é do automóvel.
[19 de Junho de 2002]
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