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domingo, 27 de janeiro de 2008

TRÊS HOMENS NUM BARCO

(A propósito do Domingo da Unidade)
São três Apóstolos: Pedro, Paulo e João.
Desde a perspectiva da diversidade eles prefiguram Igrejas diferentes.
A Igreja Católica reclama-se de Pedro; a Igreja Reformada, de Paulo; e a Igreja Ortodoxa de João. Mas será mesmo assim?
A Igreja de Pedro é a de um pastor. O Senhor disse-lhe: «Apascenta os meus cordeiros». A Igreja do Pastor tem o cajado, o manto e o chapéu. A sua preocupação é a unidade do rebanho, por isso é vigilante e teme o desvario. Pedro é uma rocha de fé, a sua Igreja é piramidal e bem hierarquizada com firme objectivo de resistir à erosão dos séculos. Pedro não é cego às visões do Espírito, nem fechado ao futuro; porém não gosta de forçar nada: é o homem da tradição, fiel às suas raízes.
Se Pedro vai ao timão, Paulo está na proa. Corre em frente, corre o risco de perder o equilíbrio. A sua preocupação é a missão. Paulo é sobretudo um homem da Palavra e não tanto dos sacramentos: «Cristo enviou-me a anunciar a Boa Nova mais que a baptizar.»
No centro está João. Uma mão está no passado, a outra está estendida para o futuro. João não é pastor nem pregador; ele contempla a beleza do Pai no rosto do Filho iluminado pelo Espírito Santo. No presente vive a eternidade. O espírito de João é a fidelidade ao amor de Deus vivido hoje.
Quão diferentes são estes apóstolos, as suas atitudes e os postos que ocupam! Nenhum deles pode dizer: Eu represento a verdadeira Igreja!, porque a Igreja de Cristo é simultaneamente a Igreja de Pedro, Paulo e João.
Três homens diferentes, mas um só barco, um só mastro em forma de cruz, uma só vela, um só Espírito que sopra, que incha a vela e faz o barco avançar por sobre as ondas do tempo.
(Henri Lindegaard, 1925-1996)

O equívoco de Vincent (van Gogh)


A vida dos famosos tem por vezes formosos equívocos, deliciosos equívocos. Como todos.
Na maré alta das suas conferências de professor universitário de espiritualidade, Nouwen deixou-se guiar pelas intuições evangélicas e evangelizadores de van Gogh (ambos holandeses, ambos marginais, ambos célebres, ambos com os túmulos resguardados pela alegria de girassóis). Entrava frequentemente em cena com uma orelha ligada, para depois se referir a alguns pontos da vida e arte de van Gogh, com o intuito de sublinhar alguns pontos profundamente espirituais.
Um dia recebeu um convite duma Ordem Religiosa feminina para falar de Vincent, no seu aniversário. No dia certo a sala estava cheíssima de religiosas vindas de dezenas de conventos. O orador principal, o P. Henri Nouwen, deu um magnífico espectáculo revelando toda a loucura de Vincent. As irmãs ouviam-no e olhavam-no com surpresa, deleite e até gozo, e também perplexidade e confusão. Nouwen não estava a ter o sucesso do costume...
Ao fim de duas horas o fim chegou. E as palmas também, mais bem hesitantes que exultantes. A Superiora Geral veio, por fim agradecer-lhe e acrescentou: — «Mas, padre, quando lhe pedimos uma conferência acerca de Vincent, referíamo-nos ao nosso fundador, São Vicente de Paulo.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Procurar juntos


Um artista, prestes a ser ordenado, recebeu um dos livros de H. Nouwen, dum amigo. (Henri Nouwen era um famoso sacerdote, escritor e conferencista muito aclamado nos EUA na época pré-conciliar e também no pós-concílio.) Levou esse livro para um retiro, porque uma das frases o impressionara vivamente. Já na casa de retiros decidiu dar um passeio pelo bosque e procurar uma pedra em que pudesse pintar a frase que tanto significado tinha para si.
Enquanto dava uma volta, olhando pensativo para o chão, outro homem, também de retiro, passou por ali, e perguntou-lhe se perdera alguma coisa. O artista falou do livro e das palavras que o tinham tocado. Sorridente, o estranho replicou: «Muito bem, eu sou Henri Nouwen. Vamos procurar a pedra juntos.»

Como andam os teus passos?


É em Cafarnaum, que Jesus se instala, no início da sua vida pública, para ver e ser visto. Desde uma esquina vê passar jovens e jovens, publicanos, pecadores e pescadores. E muitos outros.
Vê jovens, como disse um poeta, com largas passadas de esperança; e vê-os de passinhos temerosos. Olha os olhos e vê os corações.
Diz, queres vir comigo? E foram quatro: André e Pedro, João e Tiago.
Não conseguiram resistir-lhe.
Como andam os teus passos?

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Second Life

O dia foi duro? Sentes-te ameaçado? Todos te pegam? O trânsito foi impossível? O patrão foi mais uma vez horrível? O emprego não é gratificante? Não há para onde fugires? Andas oprimido, obcecado, desiludido? Bem, só te falta então a proximidade dum computador ligado à Net. Por ali já é possível fugir à crueza da realidade: não te molhas nem te constipas, não sofres nem é oprimido, e sobretudo podes ser quem tu sonhas que és, e sem responsabilidades. É o mundo virtual da Second Life; ela permite-te fugir à realidade. Ali, tu podes criar o teu mundo fictício, onde a existência obedece a uma regra: podes viver uma vida diferente daquela que tens.
Em meados de 2007 a comunidade da SL (que até possui uma moeda!) era composta por mais de oito milhões de utentes-residentes!, e este é um fenómeno que está no início. Começou em 2003.
A SL supõe um mundo criado em três dimensões. É um universo paradisíaco, com ilhas fantásticas, belas montanhas, mares extasiantes, negócios, restaurantes, casinos e igrejas. A SL não é um jogo, mas uma proposta de viver outro avatare, uma segunda vida. Ali tudo é possível, desde que se fuja do mundo real e onde não se é responsabilizado pelos próprios actos.
A realidade da SL, ainda tão estranhamente nova, é um grande desafio para a Igreja e um verdadeiro campo de missão, visto que por detrás da ficção e da fantasia vivem homens e mulheres reais, homens e mulheres que na sua caminhada buscam a Deus e a quem Deus amorosamente busca. Teria São Paulo rejeitado tal areópago? Teria recusado pregar ali a Palavra de Deus? Se são muitos os que ali se refugiam, porque haveríamos nós de fugir dali esvaziando de presença cristão um lugar — ainda que virtual — que se pode encher de Deus?
Na verdade, não falta quem assuma a SL como uma Nova Terra, uma terra digital, cujos mares deverão ser sulcados pelas novas caravelas da fé, para que verdadeiramente chegue ao fim do mundo a única Palavra que é real e verdadeira.

domingo, 20 de janeiro de 2008

Oração ao Menino Jesus de Praga


Menino Jesus, Divino Salvador do Mundo,
sois o mais belo dos filhos dos homens,
bendito Filho de Deus
gerado pelo Espírito Santo no seio de Maria.

Vós fostes Menino para me revelar a bondade do Pai
e me atrair a Ele.

Sois o Príncipe da Paz, o Sol da Justiça,
Aurora da Nova Humanidade.

Velai por todas as mulheres
que estão para ser mães.
Tomai no vosso regaço
todas as crianças do mundo,
especialmente as que não têm família,
as que vivem pobres,
as vitimas dos adultos
e as que sofrem a guerra.

Fazei-me criança para entrar no Reino do Pai.
Ajudai-me a crescer em graça
diante de Deus e dos homens.
Amen.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Oração do Pai sobre o filho


Filho meu,
que estás na Terra, preocupado, tentado e solitário.
Eu conheço perfeitamente o teu nome
e pronuncio-o como que santificando-o, porque te amo.

Não, não estás só, mas habitado por mim
e juntos construímos este Reino de que serás herdeiro.
Alegra-me que faças a minha vontade,
Por que a minha vontade é que tu sejas feliz,
já que a glória de Deus é que o seja cada pessoa viva.

Conta sempre comigo e terás o pão para hoje;
não te preocupes!
Só te peço que o saibas repartir com o teu irmão.

Sabes que perdoo todas as tuas ofensas,
antes mesmo de te arrependeres.
Por isso te peço que faças o mesmo àqueles que te ofendem a ti.
Para que nunca caias em tentação,
segura firme a Minha mão
e Eu livrar-te-ei do mal, meu querido filho.

O Antro


A Universidade romana La Sapienza (A Sabedoria) desconvidou o papa Bento XVI, que assim já não visitou a Universidade na abertura do ano lectivo. O motivo é simples: 67 dos quatro mil professores opuseram-se à ida do Papa. Razão? Não sabem ler.
A ideia de universidade é a de universalidade. Vá lá, eu até compreendo que uma universidade tenha alunos que não saibam ler (é um bocado difícil, não é?), mas agora professores! E é que tiveram 18 anos para aprender, pois data desse tempo o texto do cardeal Ratzinger que suporta o argumento da recusa.
Pronto, em nome da universalidade aceite-se que não saibam ler; mas não se aceite que não queiram aprender a ler. E se quiserem continuar sem aprender que saiam de A Sabedoria e fundem O Antro, pois até Ali Babá tinha um com mais 40 companheiros.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

O Papa «malinteso»

O papa Bento XVI não é tão intocável como João Paulo II. Não há gesto que tenha que não seja logo duramente criticado. Digo criticado, não digo compreendido.
No passado domingo, Festa do Baptismo do Senhor, baptizou 13 bébés filhos de servidores do Vaticano. Na Eucaristia que celebrou seguiu o rito pré-conciliar, isto é de costas para a assembleia. «Para respeitar o conjunto da jóia arquitetónica», justificou o Vaticano. Não há quem não critique: «É um regresso ao passado»; «é um passo mal dado»; «já não se pode celebrar assim».
Da única vez que assim tive de celebrar — porque não havia mesmo outro altar — Não me deu jeito. É de todo desconfortável. Mas compreendo o gesto do Papa. Há na Igreja quem assim queira celebrar. E se a queremos Universal havemos de aceitar que assim se possa celebrar. Quererão proibir o Papa de o fazer? Gostariam que se lhes impusesse este ou aquele modo? Por isso, ainda bem que o fez.
Mas, isso não tira que seja «malinteso», quer dizer incompreendido.
Razão tinha o conselho de Santa Teresa de Jesus: «Faz-te amar e far-te-ás obedecer». Não teve tempo, e já não o terá.

domingo, 13 de janeiro de 2008

As fotos da imprensa


Um estudo qualquer, julgo que português, revelava que a imprensa dos últimos anos traz cada vez menos pessoas a rir ou sorrir nas suas fotografias. Recordei-me do tema ao ler a crónica do Provedor do leitor, no Público de hoje. Por que é Domingo fui fazer as contas. Aqui fica o resultado óbvio dum exercício quase-inútil.


Na Capa
>> John F. Kennedy sorri sério.
>> Sérgio Godinho ri.
>> O senador John McCain sorri e a mulher, deve ser a mulher, também.
>> Cristiano Ronaldo ri feliz e um colega, de perfil, também.
>> António Barreto e Vasco Pulido Valente estão sérios.
>> três estrelas da TV a fazer publicidade ao Millennium sorriem.

Página dois e três
>> Num corredor do hospital ninguém sorri sequer.
>> Correia de Campos, Ministro da Saúde, está grave e sério.

Página quatro
>> Num corredor doutro hospital também ninguém sorri.

Página cinco
>> O piloto Carlos Sousa, no deserto, de pés numa bacia de água, não tem razões nem para sorrir. Faz publicidade à CGD.

Página seis
>> Num corredor duma prisão também ninguém ri.
>> Alberto Costa, Ministro da Justiça, está com o facies grave porque dura lex sed lex.

Página sete
>> Não há ninguém feliz numa manifestação pró-animais.
>> Numa fotografia de crianças mendigas não se vê ninguém a sorrir.
>> Numa foto publicitária sobre a Orquestra de Câmara da Europa ninguém parece sorrir.

Página oito e Nove
>> Publicidade da Optimus: todas riem felizes.

Página dez
>> José Medeiros Ferreira, entrevistado, responde sério.

Página onze
>> Idem.

Página doze e treze
>> Publicidade da Optimus: todos riem felizes.

Página quatorze
>> José Pinto Coelho e Diogo Feio, cada um em seu lugar, estão sérios.

Página quinze
>> Isabel Pires de Lima, Ministra da Cultura, fotografada preocupada.

Página dezassete
>> O maquinista do Metro do Tua; Artur Cascarejo, Rui Tulik e José Silvano vão ciscunspectos.
Página dezoito
>> George W. Bush e John MacCain estão com cara de poucos amigos e dedo em riste.

Página dezanove
>> O ditador Suharto aparece debilitado.
>> dois soldados iraquianos vigiam preocupados pela vida.

Página vinte
>> Apoiantes do Partido Kuomitang, Taiwan, festejam felizes a vitória.
>> D. Paulino Fernandes Madeca, recentemente falecido, aparece em memória grave.
>> Jacob Zuma, novo líder do ANC, saúda sorridente.

Página vinte e um
>> Um menino colombiano espreita triste por entre pernas de soldados.
>> Clara Rojas, livre, sorri.

Página vinte e dois
>> Hillary olha triste e preocupada com a gaffe.

Página vinte e três
>> Cécilia Albéniz, cigana ex-primeira dama francesa, olha divertida e desafiadora.

Página vinte e quatro
>> O pintor António Cruz, divertido, desvia o olhar.
>> Alguém, compenetrado, investiga um par de telas.

Página vinte e cinco
>> Rapaz circunspecto na Festa do Património, a 4 de Dezembro no Porto.

Página vinte e sete
>> Amadeu Ferreira, fotografado como quando escreve em mirandês: sério.

Página vinte e oito
>> Rapaz de bicicleta cuidando não cair na calçada.

Página vinte e nove
>> Publicidade: Oferta de trabalho: jovens felizes.

Página trinta e quatro
>> Crónica do Porto-Braga: Lizandro determinado; bracarense insuficiente.
>> Jesualdo Ferreira e Manuel Machado: sérios, como se exige a um mister.

Página trinta e cinco
>> Fabuloso, ex-FCP, exultante.
>> Diego, ex-FCP, convicto.
>> Giovanni, ex-Vitória de Guimarães, muito sério (ou aborrecido?).
>> Christian, ex-Estoril, feliz.
>> Mostovoi, ex-Benfica, surpreendido.
>> Ronaldinho, ex- Estrela da Amadora, exultante.

Página trinta e seis
>> Nuno Gomes, Benfica, desiludido.
>> Camacho, treinador do Benfica, perdido ou em busca.
>> Carlos Brito, Leixões, expectante.
>> PauloBento, Sporting, depressivo.
>> Stojkovic, Sporting, compenetrado.

Página trinta e sete
>> Pepe, selecção de futebol, triunfante.

Página trinta e oito
>> Pato, futebolista brasileiro, 18 anos, recentemente contratado pelo Milan: feliz em duas fotos.

Página trinta e nove
>> Jogadores do Manchester United felizes com a goleada.
>> Maniche, feliz na passagem do Atlétic para o Inter.

Página quarenta
>> Kevin Garnett basquetebolista dos Celtics está concentrado no seu trabalho.
>> José Meirim, imperial.
>> Magnus Carlsen, noruegês, 17 anos, venceu o nº 6 do xadrez mundial e está sério.

Página quarenta e um
>> Ron Dennis, patrão da McLaren, F1, desafiante numa; sério, noutra.

Página quarenta e cinco
>> António Barreto como capa.

Página quarenta e seis
>> Frei Bento domingues parece um monge a confessar-se.

Página quarenta e sete
>> Joaquim Vieira, Provedor do leitor, sereno e confortável.
>> Presidente Harry Truman, feliz e exultante.

Contracapa
>> Clara Rojas, como na página 21.
>> Medeiros Ferreira, como nas páginas 10 e 11.
>> Vasco Pulido Valente, como na capa.
>> Cristiano Ronaldo, como na capa.
>> Camacho, como na página 36.
>> Ma Ying-jeou, sorridente (e preocupada?).
>> Pervez Musharraf, aparentemente (ou talvez não) sereno.

sábado, 12 de janeiro de 2008

Poema de Natal sem árvore nem renas

(A partir dum poema de Walt Whitman)
Não deixes terminar o Natal
sem cresceres um pouco com Quem por tanto ter descido,
é chamado O Louco.

Não deixes o desejo de fazer algo belo
e extraordinário. Também na noite santa as estrelas
viram a Verdade muito ao contrário.

Não deixes vencer o cansaço
sem teres sido feliz, sem levedar os sonhos.
Nasce o Messias, foi isso que Ele quis.

Não deixes de sonhar, mesmo acordado.
Nesse reino há hinos à liberdade. Celebra e canta,
porque nem as palhas cederam à mediocridade.

Não deixes que te leve pela mão
o que faz a vida um inferno. Ama os trigais,
porque depois das flores vem o Inverno.

Não deixes que te roubem o falar, quando é um dever.
A Palavra pregou e foi calada.
É assim que A deves imitar.

No Natal semeia as letras da esperança.
Não deixes que os ventos
só soprem violentos. Falta escrever a tua estrofe!

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Fazendo o bem

Jesus passou fazendo o bem, porque Deus estava com ele! (São Pedro)

O mais belo dos dons


O Baptismo é o mais belo e magnífico dos dons de Deus.
Chamamos-lhe dom, graça, unção, iluminação,
Veste de incorruptibilidade, banho de regeneração,
Selo e tudo o que há de mais precioso.

Dom,
porque é conferido àqueles que não trazem nada.
Graça,
porque é dado mesmo aos culpados.
Baptismo,
porque o pecado é sepultado nas águas.
Unção,
porque é sagrado e régio.
Iluminação,
porque é luz irradiante.
Veste,
porque cobre a nossa vergonha.
Banho,
porque lava.
Selo,
porque nos guarda e é sinal do senhoria de Deus.

(S. Gregório de Nazianzo, séc. IV)

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Outra bênção

(Antiga bênção irlandesa)
Que a terra se vá tornando caminho diante dos teus passos.
Que o vento sopre sempre sobre as tuas costas.
Que o sol brilhe quente na tua face.
Que a chuva caia suavemente sobre os teus campos.

E até que nos voltemos a encontrar
Que Deus te traga na palma da sua mão.